Mário Giovanni Zandomeneghi, conhecido artisticamente como Mário Zan,
nasceu em 08 de outubro de 1920, na Itália. Quando o pequeno Mário
tinha 4 anos, com uma Itália devastada por duas guerras, seus pais
resolveram mudar-se para o Brasil, onde já tinham alguns parentes
estabelecidos na região de Catanduva, mais precisamente na cidade de
Santa Adélia, interior de São Paulo. Dona Ema e Sr. Giusepe
Zandomeneghi e os filhos Ítalo, Ezelina e Mário foram viver na fazenda
Santa Sofia, da familia Dumont, onde trabalharam até 1932. Nas festas
da colônia, dos imigrantes, nas fazendas da região, é que o menino
Mário sentiu interesse em aprender o acordeon. Ele ficava encantado ao
ver os adultos tocando aquele instrumento tão complexo. Até que um dia,
Sr. Giusepe comprou um acordeon para o irmão mais velho Ítalo. O
pagamento foi uma carabina e alguns mil réis. Acontece que quem se
interessou mesmo pela sanfona, foi o caçula Mário, que não largou mais
o instrumento e começou a tirar vários sons, aprendendo sozinho a
tocar. Aos 10 anos, Mário tocou seu primeiro baile, em cima de uma
mesa. Foi um casamento na roça e a partir daí não parou mais. Foi
apelidado na região de "O Moleque da Sanfona".
Quando a família mudou-se para São Paulo, estabeleceram-se
no bairro do Ipiranga. Mário então começou a ter aulas de acordeon com o
professor Ângelo Reali, para "saber o que estava fazendo".
Adolescente, além do estudo do acordeon, começou a trabalhar numa
fábrica de meias femininas e a noite, tentava a sorte nas rádios da
capital paulista, em programas de calouros. Mário Zan tocava de tudo -
até mesmo o tango e o choro. A primeira oportunidade para se
apresentar no rádio aconteceu na Educadora Paulista, atual Gazeta.
Participou do programa de calouros "Peneira Roldini" e levou o
primeiro lugar com o choro Tico-Tico no Fubá (Zequinha de Abreu),
acompanhado do Regional de Zé da Pinta. O diretor artístico da Tupi,
Armando Bertoni, ouviu sua performance, gostou e deu ao garoto meia
hora para se apresentar na emissora. O primeiro emprego artístico, no
entanto, só conseguiu na recém-inaugurada Rádio Bandeirantes, que
funcionava na movimentada Rua São Bento, centro de São Paulo. Ao chegar,
conheceu Walter Foster, futuro galã da televisão, que lhe fez um
favor: ao ouvir o nome do jovem sanfoneiro, perguntou-lhe quem iria
decorar aquele Zandomeneghi e simplificou-o para Mário Zan. "Esse sim,
é um nome forte!", teria dito Foster. Na mesma emissora, o
instrumentista era identificado como "O Sanfoneiro que Brinca com o
Teclado". Em seguida, teve uma breve passagem na Nacional paulista,
onde acompanhou a dupla Palmeira e Piraci.
Começava a década de 40, auge dos cassinos. O apogeu dos
artistas era tocar nos cassinos cariocas e das cidades balneárias.
Mário largou tudo em São Paulo e foi tentar a sorte no Rio de Janeiro,
junto com seus colegas de música, a dupla Palmeira e Piraci. Lá fez
testes em vários cassinos e enquanto isso, conseguiu emprego como músico
num "táxi dance". Quem lhe ofereceu essa vaga foi Luiz Gonzaga, homem
de coração generoso que de cara se ofereceu para ajudar o "moleque da
sanfona". Contava Mário que Gonzagão, ao ver sua condição paupérrima,
tentando a sorte na cidade maravilhosa, ofereceu a sua vaga de músico
no "samba dance" pro moleque tocar e foi arrumar emprego em outro
salão. Mário Zan foi-lhe amigo e grato para o resto da vida. Gonzagão
sempre dizia que ele era o "Rei do Baião", mas o "Rei da Sanfona" era
Mário Zan.
Tocando no "samba dance" e continuando a fazer testes nos
cassinos, um dia Mário Zan conheceu o diretor do Cassino Atlântico, o
grande homem do teatro, o polonês Ziembinsky. Ele gostou muito do
trabalho do rapaz, mas disse-lhe que nunca Mário tocaria no Cassino
Atlântico sentado. "O artista tem que dominar o palco, preenchê-lo.
Sentado é mais dificil você dominar uma platéia. Treine quinze dias na
frente do espelho tocando de pé meu rapaz e volte aqui". E foi o que
Mário fez. Treinou muito e voltou quinze dias depois, apresentando-se a
Ziembinsky tocando seu acordeon de pé e foi admitido imediatamente. A
partir daí, nunca mais Mário Zan apresentou-se publicamente tocando
sentado.
Mário começou a fazer todo o circuito dos cassinos do Rio
de Janeiro, Quitandinha, em Petrópolis, os das cidades da baixada
santista e cidades balneárias do interior de Minas Gerais.
Em 1944, gravou seu primeiro disco, em 78 rotações, pela
gravadora Continental. De um lado, a milonga argentina "El Choclo" e do
outro a valsa de sua autoria "Namorados".
Em 1946, o Presidente Dutra proíbe o jogo no Brasil e
Mário como todos os artistas da época se vêem desesperados, pois o
principal local de trabalho da classe acabara. Mário e seus colegas
começaram então a excursionar pelo interior do Brasil com circos e
tocando em cinemas. Viajaram por Minas Gerais, interior de São Paulo,
Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Goiás e Mato Grosso. Eram
excursões que duravam 6 meses, um ano... O único meio de
correspondência com a família na época era telegrama e olhe lá... Ao
excursionar pelo Mato Grosso, Mário encantou-se pela região e compôs
diversas canções inspirado nos ritmos que conheceu por lá, como a
guarânia, a polca paraguaia e o rasqueado. Em companhia de Nhô Pai (do
trio Nhô Pai, Nhá Fia e Capitão Furtado), compôs clássicos como
"Ciriema", inspirados no canto do pássaro tipico da região, entre
outros. Em Corumbá, hospedou-se no Hotel São Bento, que ficava as
margens do Rio Paraguai. Haviam chegado na cidade nas embarcações
típicas da região que recebem o curioso nome de "Chalana". Mário
gostou do nome e observando as embarcações que iam e vinham, compôs o
rasqueado "Chalana", que ganhou uma linda letra pelas mãos de Arlindo
Pinto. Essa música foi gravada pela primeira vez pelo Duo Brasil Moreno
e ganhou destaque na década de 70, quando Sérgio Reis a gravou e
posteriormente em 1990, quando foi trilha sonora da novela "Pantanal"
da TV Manchete, na voz de Almir Sater.
Seu primeiro grande sucesso foi a música "Segue Seu
Caminho", em parceria com Arlindo Pinto, gravado por Solon Sales. Mais
uma vez, Luiz Gonzaga ajudou o amigo. Como Mário vendeu muitos discos
em 1946, Gonzaga sugeriu que o contratassem para ocupar seu lugar de
solista na gravadora RCA Víictor, onde posteriormente gravaria mais de
300 discos 78 rpm e mais de 40 LPs. A indicação de Luiz Gonzaga teve a
ver com uma mudança em sua carreira que ocorria naquele momento. O
pernambucano começava uma bem-sucedida experiência como cantor de suas
músicas.
A explosão de Mário Zan aconteceu em 1954, durante as
comemorações do quarto centenário da fundação da cidade de São Paulo,
quando homenageou a data com seu hino homônimo. Morador do Ipiranga,
acompanhando as obras que aconteciam para as comemorações do
aniversário da cidade, inspirou-se em compor em parceria com J. M.
Alves, que fazia parte da banda da Polícia Militar, um hino em
comemoração a cidade que tanto o acolhera bem. O disco, lançado pela
RCA Víctor, vendeu 1 milhão de cópias em poucos meses e se tornou um
marco na discografia nacional.
Dizia-se na época que a marca superou de longe o número de
vitrolas em funcionamento no país. Até quem não tinha o aparelho levou
uma cópia para casa. Outros compraram mais de uma cópia, já que os 78
rpm quebravam com facilidade. E o disco continua em catálogo: acumula
10 milhões comercializados desde que surgiu em 78 rpm - depois
reeditado em LP e na versão CD. Mário tocou seu hino de sucesso
extraordinário na inauguração do Estádio do Pacaembu, acompanhado pela
Miami Jackson Band, uma das grandes bandas de jazz dos Estados
Unidos, em meio à uma chuva de prata, que marcou o quarto centenário de
São Paulo.
Em 1958, compôs em parceria com Palmeira, seu maior sucesso
internacional "Os Homens Não Devem Chorar", inspirado em dois romances
vividos por ele. Essa música nasceu uma guarânia, que ganhou o nome
de "Nova Flor" e depois virou o bolero "Os Homens Não Devem Chorar".
Esta canção acumula gravações de mais de 200 intérpretes em toda a
América Latina, Estados Unidos, Portugal, França, Alemanha, Áustria,
China e Japão. Em inglês, ganhou o título de "Love Me Like a Stranger"
e foi tema da novela "Pecado Capital" da Rede Globo. Na Alemanha, o
cantor Howard Carpendale também regravou a música no CD "Fremde Oder
Freunde", acompanhado por orquestra. A canção atingiu o primeiro lugar
nas rádios logo após seu lançamento. Mas foi em toda a América Latina
que "Los Hombres No Deben Llorar" arrebatou lágrimas masculinas. São
mais de 200 os registros fonográficos - principalmente no México, onde
Los Hombres No Deben Llorar fez com que Pedro Fernández vendesse mais
de 2 milhões de cópias de um único CD e foi tema da novela
"Sentimientos Ajenos" da Televisa, em 1996. Na Europa, também foi
gravada recentemente por Julio Iglesias e no Brasil, ganhou regravação
por Roberto Carlos e pela dupla Bruno e Marrone.
Mário Zan teve enorme contribuição para a festa junina
brasileira. Um de seus maiores sucessos é "Festa na Roça", em parceria
com Palmeira, que se tornou um clássico indispensável para quadrilha
junina. "Festa na Roça" é considerada a "rainha das festas juninas".
Além de mais de 30 composições típicas, lançou em disco uma série de
marcações para quadrilhas e em outra faixa, a quadrilha só tocada,
para ser dançada livremente em todos os lugares (escolas, teatros,
festas em geral). Enfim, onde tem Festa Junina, Mário Zan sempre está
presente de alguma forma.
Nos anos 70, Mário Zan foi dono de diversas casas de shows
na capital paulista e interior, onde levava os principais artistas da
época para grandes apresentações, como Roberto Carlos, Chacrinha,
Sérgio Reis, Luis Ayrão, Luiz Gonzaga, Sidney Magal, entre outros.
Seu nome e retrato estão expostos no Museu de Artes de
Frankfurt, Alemanha, ao lado de grandes instrumentistas de todos os
tempos. Sua presença está justificada como o "acordeonista mais
sentimental de todos os tempos". Na Cidade do México, já recebeu
diversas homenagens devido ao sucesso de suas músicas naquele país. Em
São Paulo, foi condecorado com a comenda José Bonifácio e com a chave
da cidade de São Paulo. Ganhou o troféu Roquete Pinto em 1954, pela
música "Quarto Centenário". Recebeu pelo Mato Grosso a comenda da
ordem do mérito matogrossense, das mãos do governador Blairo Maggi em
2006. Pelo Mato Grosso do Sul, recebeu das mãos do governador Zeca do
PT, em 2006, comenda e homenagem no Festival América do Sul em Corumbá
(cidade natal de Chalana).
Nunca parou. A música era sua paixão. Tocou em shows e
bailes pelo Brasil até o final de sua vida. Entre 1997 e 1999,
apresentou ao lado de sua filha, a cantora Mariangela Zan, o programa
"Mário Zan e Seus Convidados" na Rede Vida de Televisão, todos os
domingos, as 10 horas da manhã, programa este que fez muito sucesso,
por levar a boa música brasileira a todos os cantos do País.
Em 2004, compôs em parceria com André Dias e Meire Parce,
uma canção comemorativa pelos 450 anos de São Paulo e fez linda
apresentação no reveillón da Avenida Paulista 2003/2004, onde foi
extremamente homenageado pela prefeitura de São Paulo e dois
inesquecíveis shows na maior sala de concertos do Brasil, a Sala São
Paulo, onde recebeu bela homenagem do governo do estado de São Paulo.
Neste mesmo ano, foi homenageado no carnaval pela escola de samba
paulistana "Rosas de Ouro", onde desfilou no alto do último carro
alegórico da escola, junto ao símbolo dos 450 anos de São Paulo.
Simples, cheio de vigor e muito simpático, Mário não
aparentava o que realmente era: um dos grandes compositores populares
do século XX no Brasil, autor de algumas dezenas de sucessos entre as
mais de trezentas músicas que compôs com sua inseparável sanfona,
desde 1943, sua companheira, feita especialmente para ele, na Itália,
gravada com seu nome e com teclados em madrepérola e detalhes em pedras
preciosas.
Mário Zan era encantado pela história da Marquesa de
Santos, tanto que durante 15 anos, manteve a manutenção da sepultura
dela no Cemitério da Consolação em São Paulo. Considerava-a uma
"santa", por ter sido benemérita com os pobres de sua época, pagava
estudo para crianças pobres, deixou bens para seus escravos, enfim,
atitudes que encantavam Mário Zan. Sua admiração era tanta que colocou
na cabeça que sua última morada teria que ser em frente a sepultura
dela, no Cemitério da Consolação. Durante anos, batalhou e conseguiu
construir seu túmulo em frente ao da Marquesa.
Cheio de vigor como sempre foi, fez dez shows nas festas
juninas de 2006 e em seguida entrou em estúdio para a gravação de um
CD em homenagem ao Mato Grosso. Durante a gravação deste disco,
começou a sentir os primeiros sinais que sua fantástica trajetória
estava chegando ao final. No dia 08 de novembro de 2006, seu acordeon
emudeceu para sempre... Faleceu em São Paulo... Seu velório na
Assembléia Legislativa reuniu milhares de pessoas, entre amigos, fãs,
admiradores e imprensa. Seu sepultamento no dia 09 de novembro
arrastou uma multidão pro Cemitério da Consolação.
Recebeu da Prefeitura de São Paulo duas lindas homenagens
póstumas: A Casa de Cultura Mário Zan, localizada no bairro da Penha e
a Praça Mário Zan, localizada no bairro do Ipiranga, inaugurada em
março de 2008, com um grande show da Orquestra Sanfônica de São Paulo,
regida pela maestrina Renata Sbrigh e grandes artistas da música
brasileira e as presenças do Prefeito Gilberto Kassab, Vereadores,
secretários municipais e familiares de Mário Zan.
Fonte; Web